Houve um tempo em que havia mais do que tempo.
Não sei nomear o que nos escorregou das mãos.
Por entre os dedos do amor, a areia humedecida da ampulheta secou.
Se fosse de outra forma, não seria o tempo.
A manhã às vezes traz-nos a lua de olhar aguçado.
Gostava de te beijar as entranhas, de saber do que és feita,
aí dentro, dentro das artérias do coração
Gostava de te ouvir cantar quando a luz apaga
e ninguém consegue comprovar que também és humana.
Era em ti que eu viria a adormecer, a beijar a tua alma.
Não podemos ser todos iguais, mas podemos abrir
janelas nas paredes, podemos abrir
rios nos trilhos das florestas, podemos
amar quem nunca foi amado.
Vinho tinto, sempre o vinho tinto a lembrar-me
que a volúpia faz parte da vida, como o Porto faz parte da alma.
O espirituoso está na capacidade de tirar os pés da terra,
sem nunca arrastar os dedos inferiores.
O corpo humano foi
feito para ficar de pé,
com os pés na terra, a empurrar para cima,
com os olhos no Todo.
Podíamos ter sido assim, duas
mascaradas à procura do amor verdadeiro.
Talvez o sejamos ainda. Nada me diz o contrário.
As rosas secaram e as palavras lavou-as a água.
Será esse o teu trabalho, com o teu barco de resgate -
eu já não o tenho, já não posso.
Contagiei-me da tua essência perfumada,
mas apareceu-me uma porta de vidro cerrada.
O nevoeiro traz-me a Saudade a cada madrugada,
de luto posto na alegria de ver o mundo como ele é.
E sentamo-nos aqui, de costas a tocarem-se,
se fossemos 5 seríamos círculo.
Presságios - escrito algures entre 2019 e 2020
Comentários
Enviar um comentário