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Não se corre de olhos fechados

Sonho ainda com o que poderíamos vir a ser
como se não sentisse a realidade a tocar-me os pés.
Alcanço, com as mãos, a nuvem de maior altitude,
onde repousas, íntegra, a mirar em redor.

Era capaz de fantasiar que também me vês,
que me olhas munida de imaginação e saber.
Abala-me, porém, a âncora que acorrentei aos calcanhares.
Não me deixa voar mais, não me libera da Terra.

E sorrio, pois, quando chove, de olhos lamacentos.
Nesse estado meio líquido, meio sólido - metade quente -
sinto-me inteira com a possibilidade de te beijar.
Cresci a correr à chuva e, por isso, a ser castigada.

Pudesse eu despir-me de todo o romantismo e dedicar-me a correr. Invejo vê-los possessos de determinação, conhecendo já o caminho, de respiração controlada, a beijar o vento e a suar a dor. Invejo-lhes a disciplinada manutenção dos corpos. Desejo-o para mim, mas eu sou mais cabeça, coração na boca e amor nas mãos que oferecem de olhos fechados. Não se corre de olhos fechados.

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